sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Thomas Traumann: sem saudades do trabalho em redação

Anabel Moutinho e Ana Paula Abreu
Porque o jornalismo é uma paixão insaciável que só se pode digerir e humanizar mediante a confrontação descarnada com a realidade. Quem não sofreu essa servidão que se alimenta dos imprevistos da vida, não pode imaginá-la. Quem não viveu a palpitação sobrenatural da notícia, o orgasmo do furo, a demolição moral do fracasso, não pode sequer conceber o que são. Ninguém que não tenha nascido para isso e esteja disposto a viver só para isso poderia persistir numa profissão tão incompreensível e voraz, cuja obra termina depois de cada notícia, como se fora para sempre, mas que não concede um instante de paz enquanto não torna a começar com mais ardor do que nunca no minuto seguinte. (Gabriel García Marques)
Thomas Traumann, que começou a fazer jornalismo ainda na época do telex, no fim dos anos 80, demonstrou uma das facilidades da internet logo no início da entrevista. Numa rápida pesquisa no Google, encontrou a definição de jornalismo de Gabriel Garcia Marquez. Na opinião de Traumann é a melhor. Conhecendo um pouco da trajetória do jornalista e o vendo mencionar a citação, é natural se perguntar o que o fez largar a palpitação das redações para trabalhar com comunicação corporativa. 

Em 2008, ele deixou a chefia da sucursal da revista Época no Rio de Janeiro para assumir a missão de abrir o primeiro escritório da consultoria espanhola Llorente & Cuenca no Brasil e, em maio deste ano, aceitou o convite para se tornar diretor executivo da FSB, maior agência de comunicação do Rio de Janeiro e uma das maiores do país. Em uma só palavra resumiu a decisão: “Cansei”.

Traumann não deixou de reforçar o quanto a experiência em redação é fantástica: “dá uma visão de mundo diferente”. Mas disse também que “chega um momento que você já fez tudo aquilo”. Além do anseio pelo novo, admitiu que as condições de trabalho nas redações, desgaste físico e mental enorme, também influenciaram na mudança. “Se você olhar as redações hoje, tirar os editores e olhar; quantas pessoas com mais de quarenta anos você vai ver?”

A busca pela novidade fez Traumann, criar em 2006 a newsletter “O Filtro”, distribuída todas as manhãs aos assinantes da Época via Internet. Até ali, ele ainda não tinha tinha experiência em projetos jornalísticos na Internet. Na web, o jornalista pode lidar com um leitor, segundo ele, completamente diferente daquele de revista.

Seja Internet ou revista ambos tem, como disse García Marquez, “o orgasmo do furo”. Saudosismo ou nostalgia por não ter mais isso? Traumann afirmou com convicção que não, mais precisamente disse que sua saudade é zero. “Quando tenho um furo passo para os amigos”.

É fato que nesse mundo virtual está cada vez mais difícil de dar um furo de reportagem, às vezes uma notícia fica inédita somente por alguns segundos. Ele enfatiza que a rede altera muito as relações de trabalho e as competências exigidas do jornalista, hoje. No entanto, nesse mundo multimídia, para Thomas a competência imprescindível para ser um jornalista ainda é a curiosidade, a vontade de aprender.

Aprender, essa é a palavra. Por isso Traumann acha equivocada a exigência de experiência prévia em vagas de emprego ou estágio, quando o candidato está buscando justamente adquirir experiência. O jornalista disse considerar muito difícil contratar uma pessoa a partir da leitura de "só de um pedaço de papel”, o currículo. Por isso, quando precisava contratar alguém na época em que trabalhava em redação, costumava pedir que os candidatos mandassem uma pauta.

Traumann considera que os conhecimentos teóricos são importantes na formação do jornalista, assim como os idiomas. E avisa que é bom cuidar disso ainda durante o período da faculdade. “Uma vez que você entra no mercado, não vai ter mais tempo para cursos ou ficar muito tempo no exterior”.

Thomas Traumann irá à UFF no dia 10 de novembro, de 16h às 18h30, para o painel da Controversas que discutirá Mercado de Trabalho. Terá como interlocutores as jornalistas Solange Duart, chefe de reportagem da editoria Rio do jornal O Globo, Mariana Araújo, do Observatório das Favelas, e Suzana Blass, presidente do Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro.

Conheça o perfil de Thomas Traumann na Wikipédia: 

2 comentários:

  1. "Aprender, essa é a palavra. Por isso Traumann acha equivocada a exigência de experiência prévia em vagas de emprego ou estágio, quando o candidato está buscando justamente adquirir experiência." Penso exatamente a mesma coisa. As redações deveriam manter as portas abertas para todos que querem aprender, mas fazem exatamente o contrário. E digo mais: nessa de exigir experiência, o perfil dos profissionais de jornalismo acaba nunca se renovando. O resultado? O próprio discurso do jornalismo não se renova!

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