segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Suzana Blass: "quando há mais gente que emprego, é difícil haver espírito coletivo"

Emily Luizetto e Dilliany Justino
O Controversas conversou com Suzana Blass, presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, sobre o jornalismo carioca hoje e os desafios que o sindicato enfrenta. Confira.
Recentemente, você organizou uma manifestação contra o fim do Jornal do Brasil impresso. Qual a sua opinião sobre o jornalismo carioca atualmente?
O Jornal do Brasil é uma situação antiga, é a falência de um modelo. Usaram uma marca que tinha uma credibilidade, construída ao longo de décadas, para benefício comercial. O JB foi uma empresa mal administrada. Não havia preocupação com a continuidade por parte dos herdeiros, e virou uma disputa entre os irmãos. Virou um problema de gestão do negócio. Enquanto isso, a família Roberto Marinho tinha um espírito empresarial muito mais evoluído e acabou tomando o mercado. Junto com as alianças políticas, o Infoglobo se tornou o que é, e acabou com as concorrências. 


E então?
O que aconteceu com O Globo versus o JB nas décadas de 60 e 70, aconteceu com O Dia quando o jornal vendia quase um milhão de exemplares nas bancas nos fins de semana, na década de 90. O Dia cresceu e estava ameaçando o monopólio do O Globo, por isso eles lançaram o Extra com custos muito mais baixos. Dentro desse contexto, nós brigamos pela questão do interesse público, pela questão da responsabilidade social. O jornalismo tem um grande poder na opinião pública, influencia na condução do sistema inteiro. Quando você sai de casa, liga o rádio para saber que caminho pegar, se você vai pela ponte ou de barca, desde as coisas mais simples da vida até tomar uma decisão de qual o financiamento fazer para comprar uma casa própria, qual o melhor automóvel para comprar com o dinheiro que você tem. Todas as decisões práticas podem ser influenciadas pela mídia. Isso é muita responsabilidade.  

Como funcionam as negociações salariais? 
Quando falamos no mercado carioca de jornalismo, falamos em um sistema hegemônico, monopolizado pela Infoglobo e a TV Globo. Nós somos uma capital áudio-visual e temos basicamente um grupo de empresas que toma conta do mercado. Como presidente do sindicato, nas negociações salariais que faço com os empresários de radiofusão, jornais e revistas, eles quem ditam o que vai acontecer, são os dois maiores empregadores. Isso nos dá uma dimensão antidemocrática, de falta de pluralidade no que a sociedade recebe através desses veículos.


O que você pensa sobre a solução de se tornar apenas um jornal online?
Não podemos dizer que, mais uma vez, o Jornal do Brasil foi vanguarda e partiu para o online porque ele está prevendo fim do jornal impresso. Mentira. O jornal impresso não está terminando no Brasil. Ele está mudando. Isso não é uma realidade nossa ainda. Pode estar acontecendo nos Estados Unidos, mas ainda não é a nossa realidade. O modelo online não é um modelo caro, é barato se comparado com a TV e com o impresso. É mais fácil sustentar. O jornal online poderia ser excelente, mas para isso deveria ter uma ótima redação, não sei há esse interesse. Se o Jornal do Brasil fosse um jornal online que fizesse jus ao título JB, nós iríamos bater palma. Um online fazendo um jornalismo bacana, opinativo, informativo, com pluralidade de opinião. Eu bato palma.


Qual o maior desafio do Sindicato dos Jornalistas hoje?
Mobilização é o principal problema. Quem está bem no mercado tem que fazer a política do empregador. Fica difícil, em um mercado que tem muito mais gente do que emprego, as pessoas terem espírito coletivo. O maior desafio do sindicato, na verdade, é a natureza individualista do exercício da profissão.

O que você acha do fim da obrigatoriedade do diploma de jornalismo? Qula a importância da formação do jornalista?
Primeiro: por que a questão do diploma de jornalismo foi para no Supremo Tribunal Federal? Eu nunca vi a obrigatoriedade do diploma de historiador ou de sociólogo ser julgada no STF. E como terminar com a obrigatoriedade com o motivo de ser é uma ameaça a liberdade de expressão? Até hoje eu não entendo essa argumentação. O diploma não é um impedimento da liberdade de expressão. Se diploma é impedimento à liberdade de expressão, o monopólio é o que?
Fazer informação hoje em dia qualquer um faz. Agora, fazer informação com contextualização, fazer notícia com jornalismo realmente é outra coisa. Você tem que estar preparado, questionar é necessário. Formar massa crítica na universidade é importantíssimo para a qualidade do jornalismo. A formação jornalística tem que ser criteriosa. Você tem que ter uma formação específica porque cada vez mais, na sociedade em que a gente vive, é preciso ter um mediador responsável.



No segundo dia da Semana UFF de Jornalismo, 10 de novembro, Suzana estará a mesa sobre mercado de trabalho, que irá tratar de relações trabalhistas, condições de trabalho, competências exigidas, o mercado fora da grande mídia e o jornalismo multimídia.
Não perca!

Um comentário:

  1. "O jornal online poderia ser excelente, mas para isso deveria ter uma ótima redação, não sei há esse interesse". O maior paradoxo é que por ser mais barato e ter um espaço ilimitado(graças à hipertextualidade) e (teoricamente) mais democrático, o jornal online deveria ter um conteúdo mais rico e mais aprofundado. O que não acontece. Infelizmente dá-se mais importância à velocidade, enquanto a qualidade fica para segundo plano.

    ResponderExcluir